Terminei ontem de ler o livro A Zona Morta de Stephen King. Mais um da coleção, que aumenta gradativamente, de forma lente, mas relativamente constante.
Essa será minha primeira resenha sobre um livro dele.
O livro conta a história de John Smith e seus acidentes, enquanto criança e, depois, quando adulto, que proporcionam a ele uma 'alteração' no seu modo de 'ver' as coisas. Muitos anos se passam entre um acidente e outro, mas ambos revelam uma habilidade. Se será boa ou ruim, vai depender muito do ponto de vista do leitor, pois ela pode proporcionar informações valiosas sobre uma pessoa, para ajudá-la, bem como informações repugnantes e que podem transtornar uma pessoa. Vai depender de Johnny saber como trabalhar com esta habilidade. Seus conflitos pessoais e, após o grande período de coma pelo qual passa, o conflito com a mãe, influenciam bastante nessas decisões, bem como a pouca vontade de ser famoso, de "ter que atender, sempre, as vontades das pessoas".
Gostei do livro, porém senti uma certa compaixão pelo Johnny.
O tempo todo, todos tentando tirar dele informações que lhas convençam de que as coisas serão sempre boas e não respeitando o momento dele de se recuperar de um grave acidente, não permitindo a ele que retome sua vida, pessoal, familiar e amorosa. Associado a isto, vem o conhecimento sobre uma situação muito ruim que pode ser deflagrada dali a alguns anos e que, talvez, apenas ele seja capaz de mudar.
Acredito muito nas possibilidades de exacerbação da percepção por diversos meios. Um paranormal, vidente ou o que quer que seja, possui essa habilidade, que muitas vezes é mal interpretada e não é aceita por muitas pessoas. No caso de John Smith, além do acidente que o mutilou de anos de vida ao lado da família, namorada e de si mesmo, ainda havia as pessoas ao redor, tentando lhe sugar informações, não o deixando por sua conta para se recuperar do próprio trauma de ter perdido a si mesmo para um acidente, que lhe trouxe tantos problemas, dores e insatisfações, assim como para as pessoas, que lhe atormentavam com seus pedidos e desejos, como se lhe fosse possível agradar a todos em detrimento de poder se recuperar e voltar a viver sua vida, como desejava.
Flávia Peçanha - 26.04.13
sexta-feira, 26 de abril de 2013
sábado, 13 de abril de 2013
Pontas de dor
- Corre!
- O que?
- Corre! Rápido.
- Do que você está falando, garota? Me deixa em paz e vai brincar com as suas bonequinhas, menina.
- Não fala assim comigo. Cansei
de você e dos seus amigos me infernizando a vida a todo momento; na rua, na
escola e em casa. Mesmo longe de mim, vocês me perturbam. Sai daqui, rápido.
- Vá se tratar, garota! Procura
um médico, não, melhor, um psiquiatra, você está louca. – e desatou a
rir.
Foi a gota d’água, Mirella não conseguia
mais suportar tudo aquilo. Pensava e repensava a todo momento como agiria com
Brian e seus amigos. Desde que eram pequeninos, ainda no ensino fundamental, eles
a perturbavam, puxando seus cabelos, escondendo seus cadernos, roubando seus
lanches na escola... Agora, a coisa ficara um pouco pior, pois Mirella tinha se
tornado uma moça grande, alta e larga, devido ao crescimento e ao ganho de peso
acelerado. Apesar de pouco se interessar ou conversar com os garotos, Brian e
sua turma a perturbava. Nem se lembrava direito porque tudo começou, apenas
sabia que já não aguentava mais tanto terror. E agora, com o que tinha
conseguido fazer, era apenas uma questão de tempo para conseguir colocar esses
marginais em seus lugares.
- Muito bem, Brian, você escolheu
seu caminho, não reclame. – Mirella saiu da loja e se afastou, enquanto Brian
ria e ria, dela, para ela, já não importava, nunca mais ele daria um único
sorriso que pudesse magoá-la. Remexeu na bolsa e pegou um cigarro, acendeu
dando uma profunda tragada, expirando lentamente. Foi o tempo necessário para
que o rapaz no interior da loja limpasse as lágrimas dos olhos e retomasse seu
caminho para a geladeira das bebidas; para seu azar, não percebeu a mudança no
ambiente, considerava que ainda tivera sua porção de divertimento do dia, e
tudo graças àquela menina estranha e desengonçada para quem era obrigado a olhar todos os dias.
Do lado de fora da loja, Mirella acabava
de fumar seu cigarro. Ao terminar, segurou a guimba do cigarro até queimar os
dedos, foi aí que tudo aconteceu, tão rápido e tão certeiro que era como se
estivesse sonhando. A dor provocou uma sensação de poder tão forte que a fez
sublimar, a partir daí bastou apenas que canalizasse para onde queria. Olhou
para Brian no interior da loja, ele parecia decidir entre as vodkas ou o
conhaque e logo foi coberto por todas elas. Mirella pensou nas garrafas, em
cada porção de grão de areia que formara aquele vidro, no calor que o forjara e
separou todos eles. As garrafas estouraram e os líquidos que estavam em seus
interiores voaram junto com todos os cacos, perfurando Brian da cabeça aos pés.
Um sorriso estampava seu rosto.
Quando chegou ao setor das
bebidas Brian não sabia ainda o que levaria para a casa dos amigos, era uma
reunião simples, pra assistir um jogo de basquete qualquer, Nicolas adorava
basquete, achava legal o moleque gostar dessas coisas. Enquanto decidia se
levaria uma cerveja ou uma garrafa de vodka, olhou para a rua e percebeu que a
garota ainda estava parada na calçada, fumando e olhando para ele com uma cara
que ele considerava de dor de barriga. Achou cômico e teve certeza de que a
menina era louca quando ela terminou de fumar e segurou a ponta do cigarro
entre os dedos até queimá-los. O sorriso que estava em seu rosto quando os
cacos de vidro o atingiram de forma violenta sumiu, sendo substituído pela dor.
Sangue, dor... Sangue... Dor... Dói, tudo dói... Foi apenas o que conseguiu
pensar... E quando desmaiou a última imagem que surgiu em sua mente foi o
sorriso da garota estranha na porta da loja: ela me falou pra correr...
E do lado de fora da loja, Mirella
sorria, dessa vez mais feroz. Não sentia a dor na ponta dos dedos que seguraram
o cigarro fumado até o filtro e um pouco mais. Havia descoberto o gatilho e
como canalizar sua raiva e sua dor àqueles que mereciam sofrer tanto quanto ela
sofria. E sofreriam.
Jogou fora a guimba queimada,
procurou um novo cigarro na bolsa e o acendeu.
Aspirou lentamente a fumaça para
dentro de seus pulmões, virou-se e foi embora, assobiando.
Brian já não importava mais.
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